sábado, 2 de julho de 2011

Descrição de morte

O que é a morte senão uma partida? Partem do corpo os átomos que o formam e são libertados para o ambiente. O que é a alma senão uma continuidade? A continuidade da sabedoria que passamos a quem nos permite tal proeza.
Morrer não é algo em que se dá o ponto final na história, o que se tem são reticências de onde podem surgir caminhos diferentes na vida das pessoas que nos cercam. A solidão é algo em que se dá o ponto final na nossa história. A solidão é a pior maneira de matar-se. Nela o silêncio impera e te cala mesmo que tente falar. A solidão não deixa sabedoria e não te marca na história. Pelo contrário, ela destrói qualquer resquício da sua existência porque te silencia, tira sua melhor – quiçá, única – forma de viver: expressando-se. Morrer, depois de ter tido um propósito em vida, é inevitável, porém, pode-se evitar a solidão – deve-se, pois sua força é esmagadora e você se torna ameaça em sua vida e na vida daqueles que te amam.
Quando o que mais você anseia é a morte, significa que o seu desejo é viver. É estranho esse desejo, mas é válido, pois você sente que precisa querer para então pedir ajuda, uma mão amiga, quem sabe.
O poço não tem fundo. E você cai, cai, cai... É tão triste você olhar sua vida passando e não sentir nada além da sensação de queda. Você tenta lutar, tenta subir, se agarrar em algo, mas você não tem asas e sua boca foi silenciada pela solidão. -Você respira apenas porque foi programado para isso. Sua mente não governa mais seu corpo porque foi aprisionada nas grades verossímeis e você fica entre a prisão ilusória e a prisão da realidade. Comodismos e formalidades lhe dão asco. Está enojado de aparências e disciplinas que te sufocam e impõem uma máscara diante de ti. Conceitos pré-concebidos estão à sua volta e te diminuem, te fazem cair mais e mais. Processos psíquicos e físicos norteiam seu corpo em busca do fim daquela solidão, mas não tem coragem de completá-los, pois você quer viver, anseia por vida. Tudo deixa de ter sentido, razão, explicação... e você não quer abrir os olhos da próxima vez. Você pede para morrer, suplica para que te levem a vida. Sente raiva por não alcançar nem esse desejo.
Os olhos... a porta de nossa alma. Antes brilhavam, agora são de mágoa, de irritabilidade. Eles te olham com indiferença. Veem-te como um bandido que roubou a própria vida ou a vontade de vivê-la.
“Por que não me ajudam?”
“Por quê? Você quer? Então comece consigo!”
Ir da vida à morte/solidão e, de novo, à vida não é fácil, mas o primeiro passo é seu. É necessário recarregar-se de energia – coragem e determinação – para levantar-se, para ser alpinista no poço sem fundo, para (re)atrair você para si mesmo e aqueles que te amam irão perceber-te, irão aquecer suas mãos frias, irão enxugar suas lágrimas, irão te chamar de egoísta por querer tirar-se da vida deles, irão encher tua vida e espantar a solidão que num pedaço do seu coração ainda irá inflamar se você quiser.
E você se olhará no espelho e verá outro sentido para tudo aquilo. Verá outra pessoa, deixará que as grades sejam destrancadas te liberando do cativeiro auto-imposto.
As marcas na sua alma prevalecerão, mas estarão curadas. Basta respeitar a si e aceitar a si do modo que é.
Descobrirá que: amar é.
Descobrirá que faz parte da vida de alguém especial e que, acima de tudo, você faz parte da sua vida.
“Para aqueles que não conheço e passaram pelo que passei, que vão passar ou estão passando, mas que verão que a vida floresce a partir da sabedoria, do amor, da amizade e o respeito que se tem por ela.”

3 comentários:

  1. Texto enorme... e com belas frases durante todo ele mas, ao mesmo tempo triste, o nome é triste, a solidão é triste... A vida as vezes é triste... Mas, a soma que fez de tudo isso foi LINDA.

    Parabéns!

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  2. Obrigada. Aprendi uma coisa com O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO: através dos momentos mais tristes escrever as histórias mais belas. Essa história é bela de uma forma diferente.

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