sábado, 3 de novembro de 2012

Entrelinhas


Entre as linhas que (d)escrevo
existe um vazio que,
alimentado pela solidão,
grita suavemente nas entrelinhas.

Chama um nome
e não é o seu.
Não o é de ninguém,
é só o meu:
eu comigo.

E entre as linhas, escrevo
a ilusão de caminhar
e abrir uma porta
e deixar-me entrar.

Rádio, gavetas, jazz e solidão


12:00. Sem fome. Ouço as notícias no rádio: “Niemeyer acaba de sair do hospital”. Propagandas vêm logo em seguida. Continuo sem fome e sem força para encarar - pessoas ou vida tanto faz. As roupas me aguardam para irem às suas gavetas. Cajón. Cajón soa melhor do que gavetas. Lembrei-me de outra palavra: olvidar. Quero esquecer, preciso. Essa dúvida já virou certeza faz tempo, mas a esperança persiste em me matar tranquilamente.
“Jazz e Newport”, o rádio sinaliza. Eu acho bom o jazz, mas não escuto tanto quanto deveria. “1985: época, ao que parece, de ouro do jazz (é o Free Jazz).” Vou escutá-lo, quem sabe consigo olvidar esse amor impossível. O jazz começou. Parece animado e minha vida tornou-se preto e branco e danço com os olhos ao ouvi-lo. O sorriso no canto dos lábios ao ritmo do sax e a bateria ao fundo. Pessoas aplaudem (minha performance?). “blu, blu,blu.blu” infinito e com os dedos estalando. A música me anima, é tão... jazz! Me dá vontade de rodopiar ao ritmo.
Oh, não! Lembranças vêm à cabeça. Lembranças de alguém que também me machucou e me fez chorar.
12:10. O céu está azul. Continuo sem fome. O jazz contagia, eu sorrio de novo. Estou em um vestido de bolinhas e os lábios vermelhos, rodopiando e indo de um dançarino a outro enquanto o baterista continua a melodia em preto e branco. Eu não deveria ser dessa época. O jazz acabou.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

O importante é NÃO TER OPINIÃO


Se tiver, não expresse!
Isso mesmo! Opinião agora é considerado o gatilho de acionamento de mal-entendidos e confusões. Hoje em dia, a coisa está para ter ou não opinião?, eis a questão.

O conceito de pré-conceito é ter uma noção pré-concebida de algo (coisa, fato, alguém), mas o ser-humano, no fundo de sua racionalidade – põe fundo nisso! –, leva a coisa ainda mais a sério (ou menos a sério?): o pré-conceito virou moda.

Se você passa na rua e ri do cara que fala errado, VOCÊ É PRECONCEITUOSO!, se alguém diz que não gosta do cara que gosta de outro cara, ou da garota que gosta de outra garota ou, ainda de ambos, VOCCÊ É PRECONCEITUOSO! É modismo!

É o seguinte: o cara que fala errado não fala errado, ele tem um conceito linguístico diferente do seu, mas, mesmo assim, o que tem achar graça? E se, naquele dia, você estivesse rindo de tudo?, se ele te lembrou algo e seu sistema cognitivo acionou seu córtex que fez com que os músculos faciais abrissem espaço para um largo sorriso liberando serotonina? VOCÊ PODE RIR!
O outro cara não vai espancar ninguém (ele não é HOMOFÓBICO), ele só não acha certo, por motivos dele (morais ou religiosos), isso acontecer. ELE NÃO É PRECONCEITUOSO! Esses dois apenas tem uma opinião e a estão expressando. Isso não quer dizer que você tem que concordar com o que eles pensam. Você também pode ter uma opinião. O que todos temos que compartilhar é que devemos nos respeitar mutuamente. Independente do credo, cor de pele, etnia, cor de cabelo, roupa, língua, idade; independente de que música você, eu ou ele escuta, que filmes assistem, que novelas veem, que programas gostem temos que nos respeitar.
Somos preconceituosos com aquele que tem uma opinião. Não queremos saber os motivos dele defender seu ideal, apenas apedrejamo-lo e nos sentimos bem com isso. Temos medo de nos expor e de não estarmos certos aos olhos dos outros – como se existisse uma verdade ou certeza universal!
Seguimos revolucionando o conceito de pré-conceito.
Mas, e daí?
O importante é NÃO TER OPINIÃO mesmo!


Se você não concordar com minha NÃO OPINIÃO, fique tranquilo! Sigo a linha de outra revolução, uma muito mais legal que a da nossa geração. Nela se defende até a morte o direito de ter opinião, mesmo não concordando com ela.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Eleições 2012

Ao pensar nessas eleições, refletiremos um pouco com Charles Bukowski, em "Notas de um velho safado":

"agora o jogo está se extinguindo. Deus simplesmente não pagou o aluguel ou pintou com aquela garrafa de vinho não importa quanto eles tenham gritado ou se rolado no chão sujo com suas últimas roupas limpas. Deus disse ESPEREM e é duro ESPERAR quando a barriga está vazia e a sua alma não se sente tão bem e talvez você só possa viver até os 55 e a última vez que Deus apareceu foi há quase 2.000 anos atrás e depois disso ELE apenas fez uma meia dúzia de truques baratos pra divertir a massa, deixou que alguns judeus o enganassem, e aí saiu de cena. um homem se cansa pra caralho de sofrer. os dentes na sua boca são suficientes para matá-lo ou a mesma mulher de sempre no mesmo quarto de sempre.
"os fanáticos religiosos estão avançando (...) Deus se mandou da árvore (...) e agora você tem Karl Marx atirando maçãs douradas da mesma árvore, principalmente no rosto preto. (...)
"eu gosto dessa época. eu gosto dessa sensação. os jovens finalmente começam a pensar. e os jovens estão se tornando cada vez mais e mais. (...) os velhos e os entrincheirados estão assustados (...) nós podemos matá-los simplesmente nos tornando mais reais e mais humanos e destituindo os merdas através do votos (...)
"para aprender, não leia Karl Marx, merda seca demais. por favor, aprendam o espírito. Marx é apenas tanques invadindo Praga. não se deixe pegar dessa maneira por favor. antes de tudo, leia Celine. naturalmente O ESTRANGEIRO de Camus tem que entrar. CRIME E CASTIGO. OS IRMÃOS. todo o Kafka. (...) evite Faulkner, Shakespeare(...)
"será que o Homem baterá à minha porta?
"quem se interessa?"

sexta-feira, 4 de maio de 2012


Eu não sou católica, protestante, espírita, budista, hindu, nem maior nem menor, muito menos, melhor ou pior do que ninguém, mas eu tenho fé.  Eu acredito no poder que a fé tem sobre as pessoas. Uns dão nome a ela: Trindade, Jeová, Buda, (...); eu, apenas, acredito que seja um amor tão poderoso que nos eleva, nos dá força e encoraja a seguir. Quero agradecer, somente, às pessoas que levam a fé adiante, que elevam, através dela, o espírito humano, pois eu acredito que “um dia tudo acabará bem” (Anne Frank).

terça-feira, 27 de março de 2012

Além das obras, o homem Joaquim


O pobre mulato nasceu num mundo de pré-conceitos. De mãe portuguesa e pai negro, se viu num drama entre o pomposo e a simplicidade. Porém, nada disso o fez parar de sonhar, reagiu às adversidades.
Quando criança, dor da perda abateu-se sobre ele. Perdeu seu “Sonho de criança”, sua mãe. Perdeu sua irmã, a quem a “Alma era do céu”. Padeceu, então, de moléstia interna. Porém, não abdicou seu direito de ser livre intelectualmente. Libertou “Seu mundo”, sua mente em seus livros. Sua ambição era sua felicidade, a busca pelos seus anseios. Impôs-se aos bem-nascidos. Teve seu devido lugar nesse mundo.
Esse homem também amou. Encontrou seu outro eu, se refez da indiferença. Não sabia viver sem sua amada, sua irmã, sua mãe, seu tudo. Porém, nem sempre ele pôde contar com a felicidade. Assim como sua família fora levada, seu amor também o fora. Não existia mais chão, só tristeza e cansaço.
Mas, diferente de muitos, ele renasceu. Se antes era o incrédulo que questionava sem êxito, agora ele obtinha as respostas, mesmo não acreditando no espírito humano. É que nada podia superar a dor da sua perda.
Após 53 anos de uma perfeita atividade intelectual, aos 69 anos de vida, morre na casa de Cosme Velho, não só o maior escritor brasileiro, mas, também, o homem que provou ser capaz de superar males de nossa existência. Foi o “Homem da porta da Garnier”, o “Homem da Academia de Letras”, “Humorista sutil”, “Burocrata perfeito”, “Marido ideal”, ou, apenas, como preferia, Joaquim Maria Machado de Assim.

quinta-feira, 15 de março de 2012


“Só espero que tudo acabe bem”

A carta


Abaixo está uma carta-suicida. Um texto que encontrei no Tumblr. Não são palavras minhas, mas decidi disponibilizá-la aqui no blog.
"Carta encontrada em meio as páginas de um livro no meio de um apartamento bagunçado. Páginas manchadas de sangue, e encontradas em cima do peito de um corpo suicida, com os pulsos cortados e um meio sorriso.

'Ando bem nostálgico. Larguei o emprego a poucos dias. Penso em viajar, recomeçar tudo sem você. Talvez consiga, ser de novo, enfim feliz. Me distanciei das pessoas, ando bastante solitário. Não faço barba, sempre mancho a camisa de café. Voltei a fumar também. As vezes bebo, nesses domingos monótonos, deito no chão e me sufoco de tédio, nostalgias, saudades e porres. Não sei se consigo continuar. Tá bem díficil. A propósito, eu morri ontem. Por dentro. Apodreci, congelei, sequei de vez. Como de costume, fui aquele lugar que tomávamos café. Quer dizer, onde eu comprava o café pra te levar na cama e te acordar aos beijos. Passei em frente a uma loja de televisivos também, por incrível que pareça, nosso filme estava passando em todas as telas. Ignorei, doía. Passei a frente da livraria, e vi aquele seu livro. O favorito, até. Aquele que você tentava me convencer a ler quando nos conhecemos e ficava me contando a história. Comprei ele. Não sei, talvez me fizesse mais próximo de você mesmo depois de tudo que aconteceu. Vi casais apaixonados, e sentia inveja. Lembrava de como éramos. Vi crianças e lembrei dos nomes que tentávamos escolher antes de dormir. Via idosos e lembrava dos nossos para sempres…Do tempo que ficaríamos juntos. Tudo me lembrava você. Passei em frente aquela praça também, cujo banco fica no topo e dá pra ver toda a cidade. Aquela que você sempre me pedia meia hora que já ia chegar e demorava algumas horas se arrumando pra tentar me surpreender. Mal sabia que ficava linda de qualquer forma pra mim. O dia queria me dizer alguma coisa. Tinha perdido a noção de tempo, desde que aquilo aconteceu. Não estou dentro de mim, alias. Cheguei, e olhei o calendário. Dia 27 de julho. Naquele dia, completavam-se cinco anos após sua morte. Ontem, alias. Eu…Encarei o calendário e não quis acreditar. Pela primeira vez, cai em mim que tinha te perdido. Mesmo nos amando. Não gosto dessa ideia. Faziam cinco anos, e eu ainda te amava. Você ainda era tudo pra mim. Eu disse que seria pra sempre, não é? Pois então. Te encontro em meia hora?'
Pedro Rocha. — in suicídio diário. 

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Inverno na Cidade


Ouvi o som da porta. Ouvi o som das vozes dos meus pais. O jogo havia terminado. Minha mãe parecia orgulhosa do time que torceu. Meu pai não parecia chateado com a derrota. Sentaram na cama. “Ela gostava tanto quando o flamengo ganhava. Parecia que tinha vencido uma batalha contra mim.”, disse sorrindo, um sorriso trêmulo. “Ela gostava tanto desse lençol. Só porque foi com seu próprio dinheiro que comprou.”, disse acariciando o lençol. Podia senti-los perto de mim. Sentia suas respirações. “Onde ela pode estar?”, “Não se preocupe. Acho que ela pode nos ver. Só quero que ela saiba que eu a amo muito e que todas as discussões me faziam amá-la mais ainda.”, “Espero que ela nos ouça mesmo porque nunca tive a oportunidade de dizê-la sobre o amor que sinto por ela. Todos os contrários que sentíamos nos uniram de alguma maneira.”. Conseguia senti-los mais ainda. Transmitiam paz. Eu sentia o amor que falavam. Queria vê-los de novo, mas os olhos não obedeciam. “O que faremos com esse quarto?”, “Sinceramente, passei dias com medo de entrar. Hoje cedo vim e limpei tudo. Por enquanto, deixamos assim.”, “Ela não gostava dessas coisas jogadas. Não gostava de nada que não fosse verdadeiramente importante.”, “Então juntamos o que ela não gostava e deixamos aquilo de mais importante. Depois doamos as coisas dela. Como saber do que ela gostava?”. Ouvi um roçar de papeis. “Achei isso. Li as coisas que ela escreveu antes de... Eu li.”.  Estranho poder senti-los e não os ouvir. Ouvi ao longe as últimas palavras de ambos. “Nós te amamos, filha.”.
Consegui abrir os olhos. Uma luz forte incidia sobre meu corpo. Não era cinza. O inverno havia terminado. Eu flutuava. Era bom. Sem dor. Sem raiva.
Paz. Amor. Felicidade.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Inverno na Cidade


Parei de vagar pelo quarto. Estou deitada. Sempre deitada. Não sinto mais nada. Deve ser dormência. Não falo mais com ninguém há meses, não profiro nenhum som. Não ando mais por nenhum lugar. Não sinto mais meu corpo só a dormência de ficar deitada. Não sinto fome. Não sinto sede. Não abri os olhos hoje. Permiti-me que os músculos do rosto se retesassem num sorriso depois do meu último pensamento. “Acho que vivo como uma pessoa mor...”. Eu ainda ouço. E ouvi a porta se fechar. Era minha mãe. Sinto tanto sua falta.
Levantei. As pernas não atrofiaram. Abri os olhos e enxerguei o quarto cinza. Ainda! Gritei pela minha mãe, mas ela não voltou. Andei até a porta. Toquei a maçaneta. Girei-a e ela abriu. A luz forte do sol quase me cegou. Fechei-os instantaneamente. Voltei a abri-los. Tudo estava colorido. Sorri. Olhei meu corpo e ainda era cinza.
Vaguei até a sala. Ela e ele estavam lá. Assistiam ao jogo: vasco x flamengo - “Um clássico!”, pensei. Ela com a camisa do flamengo (nunca fizera isso) e ele com a do vasco. Esquisito estarem juntos daquele jeito. A televisão... Aquele tubo que projetava luzes coloridas capazes de refletir cor na casa inteira não me atingia. Eu ainda era cinza. Quis ser notada. Quero ser notada.
Fiquei enfurecida com o respeito que a televisão impunha neles. Gritei e não fizeram questão. Entrei na frente da TV e eles não me viram. Ainda podia ver a luz colorida do reflexo do jogo em seus olhos. Eu não existia. Pulei. Dancei. Tentei fazer tudo para que me vissem. Nada adiantou. Um pensamento voltou à mente: “Acho que vivo como uma pessoa mor...”.
Flutuei por cada canto da casa. O quarto deles. A cozinha. O banheiro. Tinha fotos minhas espalhadas pela casa toda. Eu sorrindo. Eu ainda criança. Eu chorando. Eu emburrada. Eu enlameada. Eu colando grau. Eu entrando na faculdade. Eu. Eu. Eu. Eu. Eu. Eu. Na sala, novamente, notei um porta retrato entre suas poltronas. Tinha três fotos. Uma grande no centro onde estávamos reunidos num piquenique. Outras duas pequenas de quando era bebê na primeira infância.
Não existia lágrima. Mas quis chorar. Voltei flutuando magicamente até meu quarto. Ainda estava cinza. Não conseguia me permitir afirmar estar mor... Deitei na cama. O cansaço veio. Não consegui impedir que meus olhos não fechassem. Num instante, meus braços estavam por sobre meu peito. Havia paz...

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Inverno na Cidade


Eu não sabia o que fazer naquela situação. O silêncio aparentemente acinzentado, como a luz solar, começava a me (ou nos) constranger. Cada dia que passava nos olhávamos menos. Minha mãe quase não saía do quarto, meu pai passava o dia deitado no sofá. Ela só saía para assistir a televisão. Eu vagava pela casa como um fantasma tentando descobrir a razão do leve tom cinza das coisas ao redor.
Da última vez em que fui me olhar no espelho não reparei em mim, observei apenas mais um sorriso escondido da minha mãe refletido no espelho. Fazia-me tão bem olhar aquilo. Uma onda de paz percorria meu corpo cada vez que ela entrava no meu quarto e sorria aquele sorriso escondido ao observar minha cama. Todos os dias ela repetia o ato. Parecia ser o único momento de amor que restara depois de tantas brigas.
Nunca mais falei com meu pai. Parece que finalmente o que sempre achei que sentia fazia sentido. Não tínhamos ligação alguma. Éramos a antítese perfeita: ele vasco, eu flamengo; ele da direita política, eu da esquerda; ele a favor dos protagonistas, eu dos vilões; ele falava qualquer coisa que eu discordaria no ato. Agora, nesse inverno cinza, nos afastamos de vez e isso é bom.
A vida lá fora não existia mais. Deixei meu café predileto e minha padaria predileta. Acho que nem como mais. Para não atrofiar os músculos das pernas, ando vagando pela casa. Quarto. Sala. Banheiro. Quarto. Sala. Banheiro. Quarto. Sala. Quarto. Sala. Quarto. Sala. Quarto. Sala. Só meu pai fica na sala. Quarto. Quarto. Quarto. Só vejo minha mãe quando ela vem à noite olhar mais uma vez meu lençol cinza.
Deitada na cama à noite, eu não consigo dormir. Nunca mais consegui dormir. Fico tentando descobrir o motivo do cinza. Tudo é cinza. Deve ser esse inverno, mas ele está demorando a passar. Na verdade, nunca me liguei muito nas estações do ano. Não entendo as quatro estações. Procurei livros sobre inverno, mas não acho. Meu acesso à internet não é mais possível porque não acho meu computador. Fico vagando pelo quarto, de um lado para o outro.
Há dias não vejo minha mãe. Não quero ir até a sala e encontrar meu pai. Não vejo ninguém há dias e tenho medo de atrofiar minha visão. Só vejo objetos. Aliás, a vida é tão superficial quanto minha visão de agora. Tenho medo de cegar. Tenho medo de não ver minha mãe. Tenho medo de tentar me ver no espelho. Olho para o chão e ele está cinza. Tenho medo.
A poeira está ligeiramente cinza. A janela permanece fechada, mas pela fresta consigo ver raios acinzentados do sol. Por que tudo é cinza? Por quê? O lençol, a cama, o chão, os móveis, as paredes, a cadeira, cada minúsculo objeto jogado no chão são cinzas. Será que apenas eu vejo assim? Talvez tenha crescido uma película fina na frente dos meus olhos e eu fiquei assim. 

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Inverno na Cidade


O inverno está diferente este ano. Mais frio. Mais cinza. Sem cor. Sem vida...
Quem disse que dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo?

Minha casa está sempre vazia, sem amor, sem carinho, sem esperança. 
As luzes permaneciam apagadas – o que nos favorecia, assim não tínhamos que ser obrigados a nos falar se não nos víssemos. Havíamos chegado de um enterro e os olhares fúnebres e distantes permaneciam no semblante. Usávamos cinza ao invés de preto. Tudo era cinza.
Fui para o meu quarto. Hoje não quis me olhar no espelho. Deitei na cama e sorri ao tocar no lençol cinza. “Que inverno!”, pensei. Minha mãe abriu a porta e olhou o lençol, retorceu o canto do lábio num sorriso escondido, mas não nos falamos.
Tem sido assim ultimamente: nenhuma palavra trocada. Isso começou com nossa última discussão, não lembro como se iniciou, mas lembro de cada palavra jogada ao vento, cada lágrima rolada e toda ofensa proferida. Meu pai não se envolveu, ele nunca se envolve, assistia ao futebol: vasco x flamengo - “Um clássico!”, disse. Depois só o silêncio.
Não tenho irmãos, nem amigos, só algumas pessoas a quem retribuo educação. Todos dizem que sou antissocial, mas apenas não “curto” conversas banais, só “curto” escrever... Pareço ser mais observadora, por isso, percebi o inverno diferente. As flores, no enterro, também eram cinzas. Tudo é cinza.
Larguei a faculdade há um ano. Meus pais pegam no meu pé por causa disso. Eles não entendem que já havia me alienado demais na última década escolar, não suportava mais os conceitos impostos pela “casta” superior na hierarquia educacional. Descobri que estudar ciências políticas não era para uma garota como eu. Queria recomeçar a sonhar meus sonhos como fazia na infância. Para falar a verdade, descobri mais ainda: os sonhos dos meus pais são vazios, uma caixa de Pandora sem nenhum sentimento resgatado. Talvez seja por isso que sejamos tão diferentes e brigamos tanto...
Acordei cedo e fui tomar café-da-manhã na minha padaria preferida. Foi difícil escolher entre pão cinza e bolo cinza. Tomei apenas um café “... e preto e quente...” que nada! Tudo é cinza. “Preferia estar em ‘João e Maria’ e comer delícias coloridas”, mas não me permiti ficar animada e deixar a criatividade fluir. Fui pagar o café cinza e o conhecido operador do caixa mal olhou para mim. Deixei os trocados no balcão e voei até minha casa. Meus pais permaneciam do mesmo modo quando saí: ela sentada na varanda, ele, deitado no sofá. Nenhuma palavra trocada. A luz do sol era aparentemente cinza. Tudo era cinza.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Mudar

Eu mudei.
Mudei de lar.
Mudei de lugar.
Mudei de vida.
Mudei em querer ser.
Mudei em querer ter.
Mudei para os outros.
Mudei para mim.
Mudei o caminho.
Mudei o caráter.
Mudei...
Mudei as lembranças.
Mudei os pensamentos.
Eu mudei!
Ora, mudar não significa não me querer mais como era, mas querer ser melhor que antes. 
Eu mudei...

domingo, 8 de janeiro de 2012

10 dicas para desfazer o tédio de domingo.

Dica UM: Acorde quase na hora do almoço. Isso tomará grande parte do seu dia e, de quebra, sua família não te chamará de antissocial.


Dica DOIS: Tome bastante cafeína. Nem todos gostam de cafeína, mas uma mistura que tem surgido efeito nos meus domingos tediosos é: 2 comprimidos de dorflex + uma xícara de café. A pressão abaixa um pouco e você fica zen. (Não faça isso todos os dias, mas só nos domingos tediosos).


Dica TRÊS: No almoço tente se concentrar nas conversas que sejam engraçadas.  Isso irá fazer com que a sua família acredite que você está lá e está gostando de compartilhar momentos com ela.


Dica QUATRO: Após o almoço, levante rápido da mesa.  Chegou a hora de parar de confraternizar e tirar um tempo só para você. Saia da sala e comece a pensar num banho gelado pra relaxar mais.


Dica CINCO: Durma mais. A arte de acordar para comer e dormir novamente é simplesmente necessária em domingos tediosos. Durma algumas (muitas) horas logo após o almoço, isso te dará chance de passar o tempo logo.


Dica SEIS: Tome mais cafeína. Pra não ficar só no café, como eu, improvise com refrigerantes.


Dica SETE: Tome mais um banho pra despertar. Um banho calmo pra relaxar, já que o efeito do remédio de manhã passou.


Dica OITO: Internet. Acesse sites que te façam rir. Assista vídeos engraçados de stand up. Não busque muita informação séria. Você teve uma semana corrida, por isso, precisa desestressar.


Dica NOVE: Converse com amigos. Numa hora dessas, já está quase na hora de dormir de novo. No seu domingo, já confraternizou com a família, essa é a hora de encontrar, telefonar, teclar com amigos. Eles podem salvar o resto da noite.


Dica DEZ: Abra a geladeira pra ver se tem alguma ideia do que pode fazer mais no domingo. Todos já estão dormindo, então a casa está num silêncio que você gostaria de ter todos os dias. É hora de dormir, mas você fez isso o dia todo. Busque soluções pra esse resto de noite/madrugada. Tente fazer dar certo, pois daqui a poucas horas será segunda-feira.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

A gente começa a se sentir meio vazio quando não está com ele. É como se o sopro da vida não existisse quando ele não está por perto. Não existe ar suficiente para encher os pulmões... você vai esvaziando!
Eu estou vazia. Estou sem você a vida inteira e todo ar que reservei esvaiu-se. Eu estou vazia.
Parei para lembrar dos planos que fiz para quando nos encontrássemos, mas já não suporto a sensação de ter te perdido sem nem ao menos te encontrar. É sufocante ficar sem ar... ficar sem você!
Conheci uma pessoa que talvez posso me ajudar a voltar a respirar. Ela não é como você. Talvez não chegue nem aos seus pés, mas ela me faz bem. Na atual situação, não posso me impedir de tentar fechar a ferida que abriu no meu pulmãocoração.
Chorei a noite passada, quando percebi que talvez nunca te encontraria, e não consegui respirar durante algum tempo. Achei que fosse morrer de verdade, já que por dentro estou petrificada. Senti medo ao pensar que se eu for agora terei a certeza de que não o encontrarei. Quero ter você, quero tocá-lo, quero que possamos passar uma semana deitados nus na cama.
Por enquanto, sonharei apenas com nosso casamento, nossos filhos, nossa família; tentarei conviver com a esperança de te ter um dia... apenas algum dia.

domingo, 1 de janeiro de 2012

"Mais uma vez"


Eu deveria ter dito o que realmente sentia naquela hora, mas algo me deteve. Engoli as palavras e as mastiguei. Tinham um gosto amargo de solidão... Depois que você saiu, eu continuei no quarto e gritei alto! Insultei a você, a seus pais... Insultei até a mim!


O que você pensava que eu era? Uma idiota, não é mesmo? Só poderia ser isso.

“A porta quase quebrou quando você saiu, sabia?”, gritei ao telefone.
Foda-se!”
“Não importa!”, minha voz era mais calma. “Você poderia apenas ter dito que não se importava mais se era amor mesmo ou só um passatempo pra você. Isso poderia ter mudado tudo, sabia?”.
Só ouvia sua respiração. Ainda estava nervoso.
“Então... eu te amo. Sei que não adianta mesmo qualquer coisa que eu diga nem importa mais falar que ‘temos uma família’ porque você sabe tanto quanto eu que divórcios acontecem o tempo todo. Vivemos isso na infância e sobrevivemos”, parecia um monólogo. “Só vamos tentar continuar mantendo na memória os momentos que tivemos... os bons momentos que não foram poucos. Acho que é só isso.”
De novo, só ouvia sua respiração.
“Não quero desligar”, falei chorando.
“Não, não é ‘só isso’! Eu amo você e não foi/não é/nunca será só um passatempo! Parece que você não entende”, sua voz estava nervosa. “Acontece que nos restou apenas os bons momentos a serem lembrados mesmo, nisso você tem razão” parecia mais calmo. “Você”, senti um sorriso nos seus lábios, “sabe que sempre pode contar comigo, não é? Porque somos amigos. Fique tranquila que tudo ficará bem.”.
Continuei em silêncio, chorando.
“Amanhã vou olhar a porta que quase quebrei.”
Adeus!
Eu te amo.”
Adeus...” e desliguei.
 Eu, realmente, deveria ter dito algo mais além de um breve ‘adeus’ porque depois do telefonema,  guardei as coisas numa mala e fui embora. Nunca soube se foi consertar a porta... Mas do que importa a porta agora?!



Meu amor, eu preciso de você! Nós precisamos de você...